Porque é que os Homens não compreendem as Mulheres
«Tu estás convencida há vários anos de que eu não te compreendo. Esta é sempre a teoria das mulheres, que não são compreendidas, que não são queridas, que não são adoradas, as queixas montanhas grandes, queixas enormes, sempre a justificar uma infelicidade que lhes vem lá do fundo da criação do mundo, do útero, da terra, as mulheres reflectem o útero feminino da terra, um útero cheio de aflições, em conclusão, queixam-se de tudo então entre os quarenta e os cinquenta, esse útero funciona nas alturas, é um útero cósmico que já não é parte de uma mulher, pertence à mulher do mundo. Há muita verdade no que dizes, o homem desinteressa-se facilmente, depois do acto do amor, depois logo sacode as penas, arrebita, passa à frente, domina outro mundo, a mulher fica fechada, acanhada nesse encontro muito íntimo, nesse seu mais fundo dos fundos, na identidade uterina com a ideia da criação, da reprodução da génese, salta, salta, forma-se na mulher a visão do caos a que só ela pelo amor pode dar uma nova regra, pelo domínio da paixão, pela companhia, para isso tem de ser compreendida, ela julga que é compreendida, tem de justificar a sua infelicidade pela compreensão do amor, de um outro amor, a mulher busca no outro amor o amor definitivo, amor que nunca aparece, é o poder fantásmico de convicção, que rompe todas as barreiras, a mulher atira-se, não sabe onde nem como, é capaz dos maiores actos de heroísmo clandestino, aparece, vai, surge, abre-se, mostra o que é o amor, a sua entrega total.»
(Ruben A., in ‘Silêncio para 4’)

Ruben A.
Foi professor no King’s College, em Londres, entre 1947 e 1951 e funcionário da Embaixada do Brasil em Lisboa, entre 1954 e 1972. Entre 1972 e 1974, exerceu o cargo de administrador da Imprensa Nacional – Casa da Moeda e director-geral dos Assuntos Culturais do Ministério da Educação e Cultura. Além de romancista, é conhecido também como dramaturgo, cronista e historiador.
A sua obra reparte-se por dezenas de volumes, que vão do romance ao ensaio, passando pela autobiografia, pelo conto e pela novela. Dotado de um fino humor e utilizando uma prosa de vanguarda, constitui um caso ímpar na literatura portuguesa, pela escolha de temas, pelo arrojo do estilo e pela originalidade do discurso.
No dia em que faria 91 anos, relembramos Ruben A.
Bibliografia de Ruben A.
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